domingo, 18 de agosto de 2013

do que restou interessa a voracidade da alegria

eu estive de olhos vendados pelas pálpebras, agora mesmo no sofá de domingo, e pensava na intermitência do que se lembra, e tentava perceber se as nuances do que foi vivido mais antigamente são mais tênues, fracas, apagadas do que a memória de ontem. não sei bem porque troquei o estacionamento da escola do qual eu sempre me lembrava pelo bem comum pátio onde quase nunca passava os recreios, não sei bem porque não gostava daquele lugar, nem sei bem se eu reparava que não gostava dele, e fiquei antepondo ele a lembrança do casal que ontem estava apaixonado na praia, eles tinham por volta de uns 50 anos, e deviam ter acabado de se conhecer, era muita fascinação, bonito. 
acho que em imagem todas as lembranças têm o mesmo viço, mas se pensarmos em associações do pensamento com aquelas imagens, as mais recentes tem tentáculos mais fortes, mas isso também depende do impacto, as memórias mais recentes, se forem excessivamente contundentes, elas são de um impacto puro e duro, único e não-narrável. nessas a distância do tempo opera de maneira mais associativa, os acontecimentos paradigmáticos, quando se tornam imagens da memória, tendem a ganhar relações com o passar do tempo.
mas quando isso se trata de um pensamento, ou de uma narrativa que não se viveu? 
eu usava isso, de ficar parada imaginando o transcorrer do tempo no tempo, de tanta fortificação pela imagem, eu imaginava por horas tudo aquilo que não estava acontecendo, era uma forma de me desistituir da experiência e do tempo, através do pensamento. depois tomei pudor por essas formas associativas, e acabei escrevendo poemas, quantos mais, todos os dias. gosto quando estou com tanto sabor no pensamento que a cada cotidiano vão aparecendo ruídos que se tornam versos. 
mas hoje penso que foi e é essa associação entre escrita e cotidiano, entre escrita e presentificação, combinada a um corpo muito mútuo de percepções, seja ele muito mútuo na convivência com os outros (a permeabilidade) ou, muito mais do que isso, o medo de imaginar o que não existe (embora passe tempo demais supondo ressentimentos, céus, como ando ressentida) é o que me dificulta escrever uma narrativa, umas narrativas em prosa. 
mas antes de ontem pensei uma coisa muito importante: que é preciso sentir com o corpo, a cena. que é preciso sentir a atmosfera que eu sentiria se estivesse presente. porque é isso que eu sei perceber, então é isso que eu preciso imaginar. a minha escrita nasce disso, desse passeio pela atmosfera.

Nenhum comentário:

 

Free Blog Counter