domingo, 16 de agosto de 2015

postagem

Conta-se que Jung e Freud ainda amigos, chegando na América viram do navio os que avidamente saudavam no porto as suas chegadas. Um olhou pro outro e disse: "mal sabem eles que nós trazemos o mal". Muitas vezes quando vejo algum oba-oba em torno de algum poeta lembro dessa cena primitiva da intimidade psicanalítica. Daí observo os escritos em questão & se os escritos da pessoa em questão não sabem morder o mal entre os dentes, seja como flor ou pavio, lareira ou túmulo, tal "poeta" não recebe esse nome, não é um poeta. É alguém que escreve. E tantos fomos alfabetizados! Mas se ficar só chafurdando nessas profundidades do terrível também não é nada mais do que uma mosca do lixo zunindo na podridão. Embora tenha um momento em que cada um percebe que é tão só uma mosca no lixo. Um momento, um agora. E nunca se está livre de, talvez, de repente ter que voltar a ser mosca. E há água limpa para jogar por cima do corpo e beber para dentro das vísceras e há luz para as plantas crescerem, a luz que aquece o planeta. Estar em toda permeabilidade, ser do raro, do vigor sensível entre o critério & a liberdade: ser poeta é ter a respiração mútua entre o momento e sua deriva oscilante, respirar entre o dia e a noite. Às vezes confundir-se com qual é qual e enovelar-se nas sombras queimar asas no sol e ao lembrar respirar fundo de certeza e se enganar numa percepção de que nunca mais vai esquecer de que o dia e a noite a terra e o mar o fogo e a água o bem e o mal a vida e a morte não são excludentes, embora sejam muito diferentes.

*

Alguém muito interessante poderia perguntar: mas o que é o mal? e talvez eu respondesse que é como o tempo na definição de santo Agostinho: se não me perguntam eu sei, mas se perguntam não sei. 


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O poeta é um agenciador
agencia tão completamente 
que chega a agenciar a dor
a dor que deveras sente.

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