como não há metrô que ligue o aeroporto até a cidade, descemos do ônibus na paulista. com duas malas e uma máquina de escrever, preferi pegar um táxi até minha casa. tinha que consegui-lo antes do túnel da dr. arnaldo, pra que não existisse uma imensa volta no taxímetro, e carregada fui andando, cansada, até um lugar em que fosse suficiente.
nenhum táxi passava, ou passava cheio, ou não me via atrás da banca e não parava. um morador de rua me viu naquela situação e gritou, com um sorriso gigantesco, "moça! senhora! vou conseguir um táxi pra você!" e saiu correndo, descalça, até a esquina com a augusta. quase dois metros de homem, ele brilhava dourado, como se tivesse mergulhado em purpurina, vestindo uma camiseta rota de atendente do mc donald's, pelo meio da avenida, pisando firme no asfalto.
afinal, ele conseguiu um táxi, parou, apontou pra mim, enquanto alguém descia do táxi. o homem veio gritando de felicidade, "consegui! consegui! sozinha a sra. não conseguiria", se sentou na minha frente, e já sentado, em lótus, muito gentilmente me disse "a sra. poderia me dar um trocado? preciso comprar uma roupa".
então me lembrei que fazia pouco tinha dito pro mateus que gostava de usar a camisa que era do gustavo porque me lembrava do meu pai, que sempre tem tudo que precisa nos bolsos da camisa. juntei a isso a firmeza da lembrança de contar, algumas vezes, que quando pedem dinheiro pro meu pai, ele tira sem olhar a primeira nota do bolso, sem cálculo, e dá. lembrei de dizer pro reuben "espero 1 dia conseguir fazer o mesmo", e entre tantas lembranças simplesmente agi, tirei sem ver uma nota de 20 reais do bolso e dei pro homem que tinha me ajudado. o taxista já parado guardava a minha mala e olhava com uma cara de não entendimento.
o homem sorriu, ficou um pouco encabulado, foi aí que notei que ele tremia todo suando alguma droga muito forte dentro do corpo. e todo dourado. então ele riu e me disse:
— a senhora é jornalista, não é? — e eu:
— por conta dessa máquina de escrever? não! não sou jornalista, mas é quase isso... eu escrevo.
— a sra. acabou de chegar de outro estado, não é?
— sim! isso sim!
— então seja bem-vinda à são paulo! — e fez uma vênia apontando pro chão.
— ah! te agradeço!
— já sei! já sei! a sra. é publicitária!!!!
— hahahahaha não!!!!! isso não! nem jornalista! nem publicitária! eu sou poeta!
— poeta?! eu amo poesia! foi por isso então que a sra. me deu tanto dinheiro. poeta não guarda nada! poeta não guarda nada! — e ria enlouquecido — qual o nome da sra? vou comprar seu livro!
— meu nome é júlia hansen, mas não gaste dinheiro com meu livro não! dia desses a gente se encontra por acaso de novo e eu te dou.
ele sorriu, e nisso o táxi arrancou. o rapaz dirigindo tinha a minha idade, disse:
— o negão tava doidão né? mas ele era do bem.
— era sim do bem. tem muito doidão do bem.
— é... a gente esquece.
já pra frente no percurso, achando graça no que tinha acontecido, me sentindo bem de chegar em casa, vi um carro da polícia atravancando o trânsito por simples displicência de acharem que são donos da rua, da lei, da morte, do que quiserem ser... reclamei baixo, mas com confiança. toda a simpatia do taxista, naquele momento, recuou. percebi pelo retrovisor que ele estava entre incomodado e furioso. e, claramente, do lado da polícia. estremeci, fiquei sem saber o que fazer.
quando me deixou em casa, o taxista me cobrou mais do que tinha sido, e ainda usou como argumento "gorjeta". claramente calculando o meu gesto porque tinha me visto dar uma nota alta para o acaso do amigo que no meio da rua tinha sacado tudo e pra quem qualquer centavo faria diferença. achou que eu, poeta, sou rica. logo então eu disse:
— gorjeta costuma ser um ato de gentileza, não de dívida. mas se você quer me tirar a minha escolha, fique à vontade, o troco é seu.
preocupada e contente, entrei na casa, nesse tempo nosso. às vezes me parece que a humildade e a generosidade estão do mesmo lado versus a dívida e a polícia de outro. e isso é em cada um, mesmo. um ato diário de posicionamento e escolha.
nenhum táxi passava, ou passava cheio, ou não me via atrás da banca e não parava. um morador de rua me viu naquela situação e gritou, com um sorriso gigantesco, "moça! senhora! vou conseguir um táxi pra você!" e saiu correndo, descalça, até a esquina com a augusta. quase dois metros de homem, ele brilhava dourado, como se tivesse mergulhado em purpurina, vestindo uma camiseta rota de atendente do mc donald's, pelo meio da avenida, pisando firme no asfalto.
afinal, ele conseguiu um táxi, parou, apontou pra mim, enquanto alguém descia do táxi. o homem veio gritando de felicidade, "consegui! consegui! sozinha a sra. não conseguiria", se sentou na minha frente, e já sentado, em lótus, muito gentilmente me disse "a sra. poderia me dar um trocado? preciso comprar uma roupa".
então me lembrei que fazia pouco tinha dito pro mateus que gostava de usar a camisa que era do gustavo porque me lembrava do meu pai, que sempre tem tudo que precisa nos bolsos da camisa. juntei a isso a firmeza da lembrança de contar, algumas vezes, que quando pedem dinheiro pro meu pai, ele tira sem olhar a primeira nota do bolso, sem cálculo, e dá. lembrei de dizer pro reuben "espero 1 dia conseguir fazer o mesmo", e entre tantas lembranças simplesmente agi, tirei sem ver uma nota de 20 reais do bolso e dei pro homem que tinha me ajudado. o taxista já parado guardava a minha mala e olhava com uma cara de não entendimento.
o homem sorriu, ficou um pouco encabulado, foi aí que notei que ele tremia todo suando alguma droga muito forte dentro do corpo. e todo dourado. então ele riu e me disse:
— a senhora é jornalista, não é? — e eu:
— por conta dessa máquina de escrever? não! não sou jornalista, mas é quase isso... eu escrevo.
— a sra. acabou de chegar de outro estado, não é?
— sim! isso sim!
— então seja bem-vinda à são paulo! — e fez uma vênia apontando pro chão.
— ah! te agradeço!
— já sei! já sei! a sra. é publicitária!!!!
— hahahahaha não!!!!! isso não! nem jornalista! nem publicitária! eu sou poeta!
— poeta?! eu amo poesia! foi por isso então que a sra. me deu tanto dinheiro. poeta não guarda nada! poeta não guarda nada! — e ria enlouquecido — qual o nome da sra? vou comprar seu livro!
— meu nome é júlia hansen, mas não gaste dinheiro com meu livro não! dia desses a gente se encontra por acaso de novo e eu te dou.
ele sorriu, e nisso o táxi arrancou. o rapaz dirigindo tinha a minha idade, disse:
— o negão tava doidão né? mas ele era do bem.
— era sim do bem. tem muito doidão do bem.
— é... a gente esquece.
já pra frente no percurso, achando graça no que tinha acontecido, me sentindo bem de chegar em casa, vi um carro da polícia atravancando o trânsito por simples displicência de acharem que são donos da rua, da lei, da morte, do que quiserem ser... reclamei baixo, mas com confiança. toda a simpatia do taxista, naquele momento, recuou. percebi pelo retrovisor que ele estava entre incomodado e furioso. e, claramente, do lado da polícia. estremeci, fiquei sem saber o que fazer.
quando me deixou em casa, o taxista me cobrou mais do que tinha sido, e ainda usou como argumento "gorjeta". claramente calculando o meu gesto porque tinha me visto dar uma nota alta para o acaso do amigo que no meio da rua tinha sacado tudo e pra quem qualquer centavo faria diferença. achou que eu, poeta, sou rica. logo então eu disse:
— gorjeta costuma ser um ato de gentileza, não de dívida. mas se você quer me tirar a minha escolha, fique à vontade, o troco é seu.
preocupada e contente, entrei na casa, nesse tempo nosso. às vezes me parece que a humildade e a generosidade estão do mesmo lado versus a dívida e a polícia de outro. e isso é em cada um, mesmo. um ato diário de posicionamento e escolha.
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