segunda-feira, 26 de julho de 2010

como a vida sem caderneta
como a folha lisa da janela
como a cadela violeta
- ou a violenta cadela?

como estar egípcio e mudado
no salão do navio de espelhos
como nunca ter embarcado
ou só ter embarcado com velhos

como ter-te procurado tanto
que haja qualquer coisa quebrada
como percorrer uma estrada
com memórias a cada canto

como os lábios prendem o copo
como o copo prende a tua mão
como se o nosso louco amor louco
estivesse cheio de razão

e como se a vida fosse o foco
de um baço lento projector
e nós dois ainda fôssemos pouco
para uma tempestade de cor

um ao outro nos fôssemos pouco
meu amor meu amor meu amor


[do mário cesariny]

domingo, 25 de julho de 2010

quem puder abrir mão de mim, será como o tempo,

quinta-feira, 22 de julho de 2010

"O medo, leva e traz ao deserto os distraídos, prometendo-lhes sempre algo, fazendo-os desesperar da sua simplicidade. Mas o deserto é mais simples que o medo, e a sua luz apropriada."

do Álvaro Lapa, em "seqüências narrativas completas".

tomei o lugar dos meus irmãos

sonhei, depois de semanas sem me lembrar: lembrei. com a casa em que cresci, vivi até os 20 anos, estava na escada azul e amarela - que era meu símbolo de medo e acesso - e tinham (minha mãe) emprestado minha saia branca -preferida- pra outra pessoa, eu não gostava, pois tinha que ir à Paris. eu era mais nova e meu peito sufocava - ainda - e ia até Paris.


quem era a mulher e porque Paris, eu já entendi, nem é muito importante esconder, mas não vou dizer.

terça-feira, 20 de julho de 2010

tenho de invadir a minha vida verdadeira

fazendo uga uga tomaram-na como peixes pelo anzol
tinham minhocas que eram como cenoura na frente do burro
o burro que morreu entre meus dentes
como uma cabeça de bode enterrada
e eu parente, co-parente, bi-polar de onça

sou ROCHA ROCHA

há sempre um rochedo a implodir um caminho que transtorna o hoje de pedregulhos em poeira





nossa senhora da transformação rogai por nós
revogai as estradas perdidas, encaminhai o tempo para si mesmo
multiplicai os abismos dos nossos inimigos
dai boas noites a todos, nossa senhora, e dorme.


tudo que me atravessa encolhe um pouco os ombros
vês aquela?
multiforme em si tem dois braços duas pernas uma cabeça cheia de estrelas no meio
ah! pensava que era um buraco negro
não, não é uma brasileira
até que é branca branquíssima
eu sou filha da via láctea.




faz tempo que não encontro uma vaca pra dizer que VACA!


o calcário europeu faz mal para os meus cabelos ficam parecendo lambidos de vaca
ou território de patinação de patinetes dos meus pensamentos.


mas que bonitinho



descobri que esses são aqueles do mario bros e também os da alice e tb os de iluminação dos vedas e há vacas muito loucas por aí?

segunda-feira, 19 de julho de 2010

inventar a minha vida verdadeira

diário de julho de 2010 agora

"tenho de inventar minha vida verdadeira"
cada coisa por dentro é feita de pedra
de atiradeira passo à contração
consolatriz sem convicção

tenho duas gajas cheias de gaivotas esperando pra cagar em você / elas vivem em gaiolas sobrenaturais

(nas gaiolas sobrenaturais tudo tem cor de raio-x / inclusive os mêandros dos brócolis)

"em Portugal o letreiro dos taxis ocupados parece chamar mais atenção do que os dos desocupados". meu amigo riu.

íamos em busca da chave.



aqui em mim tudo ruiu.

no último mês me colocaram (milkshake) num liquidificador lançaram-me por dentro em tudo em tudo e zzzzzzás me devolveram sorvete de novo no pote

percebi que não tenho nenhum medo absolutamente medo nenhum de não saber pra onde vou, meu único medo é de continuar assim como e onde estou.

e já senti tanto isso que parece ser uma vertente da minha vida

será que é possível derrubar vertentes da própria vida como numa casa se retirar as paredes?

UMA CASA EM QUE SE TIRASSEM AS PAREDES E O AR CAÍSSE SOBRE NÓS

esse ar veio parar no meu pulmão esquerdo

cada noite a cama numa posição diferente e tantas emergências na nossa conquista de encontro e vigilância e as vidas de redor sempre a arder nossa vida mesmo sempre a se querer como nossa e a certeza de que o que vale é crescer, ser sempre jovem, humildizar sem desdém por si mesmo no tamanho de envolver a vida com o que é e comer bem um coração que não tivesse centro eu aprendi tanto que depois até me despreendi agora precisamos ir tomar um gelado pra falarmos a respeito as pálpebras que acompanham as órbitas vivem mesmo é dos nossos lábios fechando com o calor minha boca também está seca não estou em brasília não sou ana cristina e

os dois vão se encontrar numa rua qualquer e vão se abraçar e vão saber quem está mais nervoso que o outro vão ter certeza que estão mais nervoso que o outro e até que em algum momento eu vou aparecer e convidar pra dançar e a gente vai dançar e depois de manhã vamos sentir fome e vai ser preciso comer e vamos ter certeza que não há, nem nunca houve, amizade mais brilhante do que a nossa, e ainda bem que acontece

sem amor todo meu corpo me chama atenção ATENÇÃO estás VIVA E SEM eu quero um coração batendo novíssimo que me retire desse estado de pedra acho que amanhã vou à praia tomar banho de novo ou ficar imóvel imóvel embaixo de mim mesma que é o mesmo que estar por fora de ti (ainda bem que estou por fora de ti) e encavocar um escaravalho no lugar do coração ninguém acredita quando eu digo cuidado que em mim mora o Maior Escorpião e ele atravessa os ferrolhos das portas pelas órbitas

"nos anos 60, sabe? aquela época em que tudo era permitido, o amor livre, só não valia arrancar os olhos das órbitas"

me espanta a naturalidade como as pessoas falam sem parar e convictamente que dizer coisas com lógica vai fazer uma lógica eu que incendeio tudo ao redor em mim em busca de uma escrita mais debruçada em desconcatenar e ao mesmo tempo incidir como a única pequena luz viável naquela brecha de prédio e que faz toda a diferença no caminhar de alguém que vem confortavelmente reparando em viver e nos caminhos sempre úteis na sua inutilidade contínua

e eu que já saí de tantas já entrei em tantas acho que é mesmo a única solução viver desenfreadamente até que algo nos refreie

(eu tô freiada até os dentes, tô um burro morto, mataram um burro nos meus dentes ele já tava empacado agora ele tá até apodrecendo pobre burro pobres dentes pobre dentifrício insuficiente e que ainda por cima o miúdo de alguém rouba pra colocar na escova de dentes de dinossauro e depois quando ele fala disso parece que enlouqueceu num mundo de artifícios de plástico mas ainda podemos contar com os jardins e nesses jardins descobrir que não há porque não estar a todos os momentos perto dos jardins das árvores das marés e que as marés e seus marulhos e conchas são tão incendiários como o arder conflituoso dos joelhos, a sálvia que eu vou me dar de presente amanhã vai ser ela, certamente, que vai arder em mim essa insuportabilidade tensa de resistir eu

eu resisto tanto que resistindo não desfaço

viajei completamente no próprio sentimento, eu já contei, namoro o amor, ele me namora, somos abelha na florzinha o mel é que é um outro que se interpõe de substrato entre nossas espécies naturais e eu poderia me arrepender de tudo tantas vezes e não sei se é melhor ou pior (lembrei que comprei uma bicicleta que usei 4 vezes e esqueci no fundo de um coberto úmido, mais uma vez e agora lá deve estar anoitecido já e frio, mais frio do que aqui, eu vivi lá nessa época do ano passado e eu resistia a todas essas oscilações escrevendo e organizando e trabalhando e comendo conforme meu apetite e a geladeira cheia)

tudo que eu deixei pra trás, inclusive o analista, a análise não me larga mais, jamais. o analista também não. é um amor.

no fundo, eu sou capaz

ele não, ele é um estúpido de aberrante e um estúpido duplicado porque sabe que é um estúpido é quantas vezes mais estúpido por isso? um estúpido que é uma flor não deixa de ser um estúpido.

fazia tempo que ninguém me olhava como ele assim debaixo e com óculos depois sem óculos e uma sacolinha de algodão pra aclimatar as texturas das conclusões indefinidas mas dessa vez eu não quis brincar de em aberto eu quero é o resolvido resolvendo-se mútuo com você que eu posso ser franca eu até levantei o pézinho na frente do comboio que ninguém me beijava assim com dois lábios grossos que tens que delícia és, quer?

não sei quem sabe o que será de ti agora? bebes em algum lugar pensando que ainda és o mesmo colecionador de histórias de amor enquanto ele bebe os fracassos de tudo que nunca encostou um fio de cabelo por não passar da peneira de si mesmo doido doido pra ter os tornozelos até os tornozelos embebidos de desejo e mordidas mas depois de um tempo ou a gente vive ou esquece não dá pra enternecer tudo o que não se vive com a delicadeza que eu tive eu agora não vou regugitar essa mordaça em ninguém tô comigo mesma

tô comigo mesma



e foi tão bom que você apareceu me inventou dançou lambeu pena que já desapareceu tudo em mim não pude nem criar dessa vez o melhor de tudo é quando as coisas dão tempo de acontecer e se eu continuar um velho marinheiro vesgo visitando país arruinado de país arruinado um dia vou ter que conseguir um emprego

e não ficar com 40 anos virar homem até os 40 anos e ter uma barriga enorme e ficar pensando na mesada da minha mãe enquanto olho o armário de vidro separado no supermercado com as bebidas caras os whiskys e também as giletes - por que será que as giletes ficam ali? são fáceis de roubar? ou uma pessoa que as compra tem que ter cara de intenção de se depilar e não se suicidar? estariam os supermercados fazendo um bem-serviço para o público social humano não se matar? mas e a gordura hidrogenada? e os hormônios nos frangos? e a vida sem pêssego em calda?

então ele parou de me escrever eu parei de escrever pra ele e ele não é uma mesma pessoa

eu gosto dos pronomes indefinidos porque eles são funcionais quem inventou isso aqui assim como quem inventou as mesas e também quem inventou qualquer coisa que seja suficientemete bué da fixe é alguém genial

as línguas foram inventadas por mim, todas elas. é por isso que eu escrevo tão bem.



ele riu, quando perguntou que estilo você escreve? e eu quis entender o que ele queria dizer com isso? "mais racional ou mais emotivo?" eu VIRGE TÔ NO MEIO DO CAMINHO. ele riu e não entendeu. daí eu peguei o ombro dele, era bonito ele e tinha cheiro de sabão novo, e aparência do melhor abraço do mundo e ele fez mais duas ou quatro formas de dizer como poderia ser que eu escrevo até que falei: definitivamente, você quer saber? eu escrevo bem.

e esquecer sobretudo esquecer eu tô precisando de esquecil, não de anonimato

mas também não sei porque profissionalizar (escrever) a coisa que eu mais gosto de fazer (assim, profissionalmente)

quando eu me sinto com 16 anos eu me sinto com 22 também e depois agora com 26 eu tô me sentindo de um jeito que nunca me senti antes? que é um jeito que eu não tô sentindo NADA ai meu fernarndo pessoa no oratório ai fernandinho me ajuda que eu leio o bernardo soares e acho ele tão realista ai fernando pessoa meu que pastel de natas poderá me salvar? será que tá faltando graviola? ou é rabiola? rabanada rebuscada schoppenhauer chopin é c'os cacete

ah! aquela do arnaldo.

faz nem um ano que ouço arnaldo antunes.

"qualquer coisa que se sinta"

agora eu vou escutar, não vou escrever.

ah só quero dizer uma coisa a mais

e agora, quem poderá me liquefazer?



sábado, 17 de julho de 2010

eu não sei. mas acho que é preciso amar muito.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

um país planctônico

o vento em Lisboa às vezes é tão forte que é como ter passagens a arder

sei que minha máquina de escrever está cheia de pêlos de gatos, mas eu não tenho mais gatos. e nem um aspirador de pó para retirá-los. não sei o que é então que estou fazendo da minha vida se não tenho gatos nem um aspirador de pó nem um homem pra me fazer esquecer que não tenho gatos nem aspirador de pó nem pai nem mãe por perto só uma garrafa de vinho do alentejo uma meia dúzia de livros de poetas mortos (que são tudo menos mortos) e também não foram eles que sujaram a minha máquina de escrever. ah se pelo menos eu tivesse aprendido contigo a leve arte de precaver os objetos da deterioração, mas nem isso, minhas calças sempre rasgam, as palavras ferem, e desconfio que ninguém, nunca mais, ninguém, entrará pela minha porta a não ser que seja pra dizer adeus, que nunca estive aqui.
Não encontro
no meio de todas essas histórias
nenhuma que seja minha.
Nenhum desses temas me consola.
Espero ardentemente que me telefonem.
Espero que a chuva pare e os trens voltem a circular.
Espero como se estivesse em Lisboa
e sentisse saudades de Lisboa.
Bateriam à porta, chegariam os parentes queridos, mortos recentes,
e não me dou por satisfeita. Mas os figurinos na noite de
estréia! imediatamente antes!
A goma, o brilho no camarim.

Ana Cristina Cesar, dos Inéditos e dispersos

terça-feira, 13 de julho de 2010

quem corre pra viver toda aventura (quando pode) foge de qualquer confusão





quinta-feira, 8 de julho de 2010

o que acabou não cessa de começar: amor

meus ombros viraram uma asa delta desde que você me apareceu. sobrevôo a cidade, ninguém vai partir. cobriram os aeroportos de festas. os vigilantes das bagagens começaram a dançar, os cães farejadores se roçam e o próprio raio-x se acelerou ao ponto de criar uma batida, destroçou os vidros e o sol come por dentro da sala de embarque. sim, fui eu, ele meu, imperador. o nome do rei é Tempo e ele dá morangos às carabinas.

os frutos imitam o sangue nas propriedades de uma boca. alguém em mim aprenderia a amar tudo o que é incerteza e a descobrir todas as ultrapassagens da lógica. cheguei na selva : o que eu sinto é verde e denso e úmido e não é você. escuta: uma lógica que não é silêncio. é hiato. o esquecimento é uma produtividade. tenho vivido.

somos todos pessoas, impressionantes as coisas que precisamos dizer para nos lembrarmos.


 

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