Só você sabe que eu não como a ponta dos pães
mas não sei como poupar as bordas das coisas,
 limpar ou usar uma coisa até o fim também não é comigo.
 Você também já viu de perto como eu posso perder o foco
 ser levada pro invisível das coisas
 e depois de muito me perder 
 de lá trazer mensagens muito claras.
 Você já viu o cerne do meu medo
 e o quanto eu posso sentir medo 
 e que eu o herdei. Antes de mim 
 quantos da mesma espécie — 
 os iconoclastas com rigor — falharam
 como você e também eu falhamos
 uns com os outros? Eu já te disse
 preferia que não conversássemos
 nesses termos de erro
 porque tanto no meu caso
 como no teu
 o perfeccionismo leva ao incêndio
 e tem sido boa esta temporada
 de silêncio. Afinal, entre nós o intervalo
 sempre foi uma forma de ligação.
 O primeiro SMS que você me mandou
 falava que onde você estava o céu tinha estrelas.
 Eu estava no Sul, você no Norte
 e o teu país era o meu também.
 Não chovia, mas eu não via um só brilho
 no céu — eles estavam todos em mim
 e como eram só teus
 não te entreguei o facto.
 Contigo não preciso nunca entregar nada
 já está tudo sempre entregue
 e eu inventei que tinha visto as estrelas.
 Hoje você sabe que eu exagero em tudo.
 Posso até ter falado dos satélites
 que vemos andando devagar no céu dos lugares
 em que o céu à noite é muito limpo
 há pouca luz elétrica ao redor
 então as pessoas falam ora direis os alienígenas
 e no entanto — você também sabe— deve ser a emissão 
 da BBC ou da NASA, ou alguma instituição que nunca
 saberei muito bem o que significa
 ou algo menos definido do que isto
 mas você leu em algum livro a respeito
 e você não vai me contar o que leu
 porque acha que, no fundo, 
 nada disto me interessa 
 no fundo você acha que nem você me interessa
 embora teus olhos sejam o veículo do meu fascínio
 e eu sei que isto é só uma forma
 de você se manter comigo
 no teu silêncio, no teu mistério.
 Que é uma forma de sofrer no mundo.
 Logo de início percebi que você
 nunca se tornaria ausente
 nem na solidão emaranhada 
 onde você se enfurna 
 abisma os teus lugares
 reconhece e alimenta os monstros
 pacifica e encontra luz —
 onde eu espero que você nunca
 me leve. Mesmo quando eu me esqueço
 que estamos um ligado ao outro.
 Mesmo quando eu quero te aniquilar.
 E ainda enfim quando reina o silêncio 
 depois duma disputa, ou durante 
 o sono profundo, distante
 ou ao redor 
 você não some 
 você nunca se ausenta
 mesmo nos milênios 
 que se esquece
 de falar comigo
 que se fecha
 e desaparece 
 eu nunca duvidei
 da tua presença. 
sexta-feira, 30 de junho de 2017
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