sexta-feira, 29 de abril de 2016

na antevéspera da morte da minha avó, no ano passado, eu sonhei o que está aí no link. passei os meses seguintes a sentir a morte pairando por redor alto em cima tudo nuvem chumbo & eu resistindo com música.

adoeci umas semanas antes da minha avó morrer (na minha vida grandes adoecimentos tendem a anteceder acontecimentos tenebrosos, não é a primeira vez que me acontece) e achei que o sonho falava disso. mas não. o sonho, como a doença, antecipava o futuro. o sonho do dia 18 de julho me dava a receita para atravessar o pós-19 de julho.


sei que hoje, quer dizer, nesta última noite, sonhei que estava no mesmo consultório que no sonho de 10 meses atrás. só que dessa vez estava com a Lisa, uma enfermeira de medicina chinesa que já me ajudou algumas vezes a ficar bem de modo muito humilde e pouco ostensivo. eu estava deitada numa maca, a Lisa vinha com um sorriso e a Lisa me enrolava a coluna numa posição como um caracol, envolvia minhas pernas no meio do meu pescoço, até que eu fiquei completamente confortável.

quando atingi o conforto total, que paciência, que ternura por existir num corpo, a Lisa me desenrolou calmamente, eu então percebi que tinha deixado a posição fetal em que estava e a Lisa disse "pronto, você acabou de nascer, agora você é você mesma". e eu acordei, muito agitada, porque nascer, vamos combinar, nascer é muita coisa ao mesmo tempo agora.
cheguei no poupatempo pra habilitar meu título de eleitor cerca de 3 horas da tarde, uma fila gigantesca chegava até a porta de entrada, fui pedir informações no balcão principal, voltei pra fila da porta de entrada, a atendente da fila. sim, uma atendente no final da fila (o Brasil não para de me surpreender, cada final de fila tem uma pessoa responsável por ficar no fim dela explicando pra quem chega que aquela é a fila exata, sim, ou não) me diz "a última pessoa que vamos atender nas próximas 2 horas é este senhor aqui"; eu respondi "esse senhor na minha frente?" e era, e eu tinha chegado 4 segundos depois que o senhor na minha frente que era o último da fila. desgraçados sejam os segundos que levam ao imprevisto.

resolvida que não voto desde 2008 e determinada a que isso não continuasse assim, perguntei que horas eu conseguiria ser atendida. não satisfeita com a resposta "volte amanhã", insisti e ouvi da atendente "talvez às 17h voltemos a abrir para atendimentos, vai depender da demanda do sistema".

e eu "demanda do sistema? mas como vocês dizem que ficam abertos até às 19h pra esse tipo de serviço e faltando 4 dias pra o prazo final eu só vou ser atendida se uma 'demanda do sistema' funcionar?". com o nada feito da demanda do sistema (what a fuck? não consigo lidar com esses conceitos ambulantes que viram triviais verborrágicos), resolvi ir até o mercado da Lapa, que é um micro lugar de preciosidades, por exemplo eles vendem as melhores velas de 7 dias que alguém já pode ter encontrado, cachimbos e sedas a preços módicos, e tem as melhores lojas de ervas que já vi: duas, uma em frente da outra, com tudo fresco. ervas pra culinária? também. mas ervas pra medicina. e as plantas têm uma capacidade muito curiosa de cuidar tanto do emocional como do espiritual das pessoas.

no mercado fiz uma hora, entre outras coisas descobri com o rapaz da loja que "canela de velha", a planta que uma senhora comprava, serve para osteoporose. não conseguia discernir com tanto verde sendo vivo ali ao dispor e com tanta especificidade de ervas frescas comprei um trivial ramo de arruda bem farto, enfiei no bolso do casaco e voltei pro poupatempo, sem não antes dar uma olhada em pijamas, que o frio chego. entro no poupatempo com o ramo de arruda no bolso esquerdo, grandão gigantesco, eu a samambaia ambulante do amuleto, voltei, agora vocês vão me atender. não eram 17h, eram 16h20 e como eu desconfiava, já atendendiam novas pessoas. a fila estava minúscula, colei no fim dela.

aí no fim dela vem outra atendente que me diz EXATAMENTE a mesma coisa que de 1h30 antes. eu falei "amiga, não tô acreditando que hoje é meu dia mesmo, também quem mandou trabalhar com astrologia e vir aqui justamente no dia em que mercúrio foi completar a turma da retrogradação de vez e 70% do sistema solar tá andando pra trás?!!!! e eu esperando justiça eleitoral...". quer dizer, eu sorri e expliquei, e argumentei e fui simpática e exigi os meus direitos e reclamei e sorri novamente e fui ficando no fim da fila até, simplesmente, entrar pra área dos que iam ser atendidos porque eu me parecia um deles. uma mulher atrás de mim fez a mesma coisa. o Brasil é mesmo dos gregários cheios de jeitinho.

quando eu já estava com senha a atendente voltou e me disse "isso que dá ser esperta e discreta, outra pessoa não tinha conseguido" & a mulher do guichê comentou que dava pra sentir o cheiro de arruda de muito longe, mas que ela achava que vinha de outra mulher e eu reparei que a outra mulher era negra e pensei "o que pensar disso?". então olhei bem pra arruda enquanto ela conferia meu endereço e preenchia no sistema cheio de demandas, quando percebi que o cheiro de arruda tinha aberto minhas vias respiratórias e eu tinha parado de espirrar porque deusnosacuda esfriou eu resfrio, tô pra renascer numa roupa de astronauta mas enquanto isso não acontece tô me valendo mesmo das arrudas & afins, cada vez mais são as formas mais imediatas que encontro de regeneração.

sei que umas duas horas depois eu estava conversando com um atendente que me dizia pra eu não reclamar da foto que ele tinha tirado porque no inverno é a época que as mulheres se vestem melhor e eu tive vontade de mostrar pra ele a quantidade de kleenex usado que eu tinha no bolso, mas sorri e falei "vai essa mesmo", enquanto pensava "jesus no título que cara de que fumei seis que eu tô". quando o rapaz me deu finalmente meu novo título nas mãos eu disse "é esse papelzinho? só isso? nossa, foi tão fácil, que emoção". ele riu. e eu pensei "vai ser a primeira vez que vou votar na cidade em que eu nasci".
minhas narinas estão queimadas pelo fogo que mora no vento frio
toda e qualquer coisa que eu fizer agora aqui ainda não é um livro
vejo imagens da escola em que eu estudei anos só que hoje
não sinto nostalgia, nem vontade de voltar pra casa.
estou em casa.
escrever ou não é só uma questão de com que música
fazer deixar a música agir no pensamento
mas hoje estou tão cansada que não consigo delirar em nada
sem recear bater num espeto um espinho uma força qualquer
esmagante também conhecida como eu mesma em dias úteis
nos inúteis esmago outros seres vivos como pequenos ácaros
deitados embaixo do meu travesseiro, eu quis dizer
inconsciente. como é bom não fazer sentido!
não sei se por anarquia ou nem aí não voto desde 2008.
não há exorcismo como o da música nem delírio esquecimento, nada

quarta-feira, 27 de abril de 2016

depois de um copo de água morna a primeira coisa que eu vi hoje de manhã foram umas mensagens do Ribão fazendo uma amorosa resenha do meu livro por WhatsApp do outro lado do oceano, eu ainda não tinha tomado café e não entendi nada, enquanto eu não entendia nada uma menina me escreveu perguntando se eu dava consultas de "orientação espiritual" e eu pensei no que não faço e é tanta coisa testes vocacionais nem falo que elx vai se divorciar ou não só porque é o que a ansiedade paga pra ouvir, mas à pergunta dela eu respondi que "sim".  tivemos também que arrumar o estoque de livros e descobrimos que uma cadeira apodreceu e que um gato mijou no obelix d'Aquele quartinho. aí eu ajudei um homem muito bonito e conversei com nosso amigo advogado amigo e fui me sentir atrasada com algumas coisas gravei um vídeo que vai passar até no Peru recebi umas coisas às quais não consegui reagir e finalmente o Daniel Faria chegou aqui em casa comi cogumelos e depois comi bife que proteína não me falte quando me sinto em colapso, passada essa parte deitei com as pernas pra cima, não entendi nada das notícias nacionais. minha mãe está gripada meu pai está bem quando falei com ele ele reclamou de alguma coisa mas eu não prestei atenção direito no que ele estava falando e no final do dia falei com minha sogra no telefone que me disse que eu faço muito bem para o filho dela e averiguei no site da justiça eleitoral o que é preciso fazer pra que eu saia da situação de indigente cidadã perante as urnas que vão dar nisso que já deram, mas, olhe, são tantos planetas retrógados no céu é por isso que tudo está muito lento agora revisando rewind é uma espécie de vento ao contrário e eu sei com um só gesto como fazer chover cometas e meteoros da ponta dos meus dedos se tenho as palmas das mãos muito abertas.

domingo, 10 de abril de 2016

a velha foice do futuro

são três os caminhos. parei por aqui na esperança de que depois soubesse pra onde ir. acontece que lá atrás ficou quem sabia as respostas. as mágicas e as substâncias vão comigo para onde quer que eu vá. só tendem a aumentar. eu disse isso na lista dos prós, nos contras há o medo, o receio do salto grande grande alto cabrum! o erro. gosto tanto do sim quanto do não, por isso penso muito nas coisas, muito no caso a caso. 

*

fiquei pensando tanto que não consigo sair do sofá. muito mais rápida do que eu: a realidade. muito mais rápido que a realidade: o pensamento.

*

mil anos atrás eu tive um namorado que dizia que a ansiedade é como um carro afogado. você pisa tanto no acelerador que o motor paralisa por excesso combustível.

*

convites para ir.
a imprecisão do futuro.
o amor pelo adiante.



*

sem saber do futuro
amo o adiante
arrisco pelo instante
meu nome: duração

há mil anos um amor
deu-me um espelho
dizendo: arisca te deixo
sozinho me encaixo

no / nú

eu amei aquele
adeus como amo
todos: o sim o não
têm tantas lábias

o passado, o futuro

*

alguém me disse que as pessoas dividem-se nas que ambicionam o futuro; nas que estão presas no passado; e as que aceitam o sempre presente.

ouvi dizer que as pessoas dividem-se nas que preferem o sim; nas que preferem o não.

todos que criam hierarquias assim acabam por conhecer os seus contrários. lei do mundo: os diversos onde tudo é mútuo.

perdido mesmo é quem achou, pois fez do perder-se o conhecimento do achar-se.
e vice-versa.

isto é incompreensível.
eu sei.

 

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