quinta-feira, 29 de abril de 2010

hey, resposta

é uma mudança paradigmática, certamente. talvez uma saída do texto como da internet. tantos usamos minúsculas, usarei, serão meus emails assim. mas no poema abaixo e, até segundo acontecimento espontâneo, em todos os novos, quero marcar que foram herberto helder, hilda hilst e iosif brodskii que me convenceram a usar maiúsculas. pelo ritmo, e suas outras possibilidades de clareza e pontuação, não foi ninguém não. nem eu mesma, aconteceu.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

II


Desde os dezesseis anos estou neste estacionamento.
Viagens, lustres, dinheiro: nada: se fecho os olhos o que vejo são vagas.

Não me balizaram. Fui eu mesma
vim viver aqui, não acredito mais, neste ângulo entre paredes.

Esperava deste parque aquele por quem a vida corria.
Ir com ele. Como um cometa,
uma pedra que me arrastava do centro, toda lançada,
natural como as baratas que sobrevivem desde os dinossauros.

Um arco e duas flechas. Sismo veio
todo o mundo do juízo, todo o meu poder de confissão.
Encontros de concreto, folhas de eucalipto caindo, putrefação.

Do que restou interessa a voracidade da alegria
um falar mais honesto emergirá na superfície
a pérola homem que cresce por dentro das ostras, das minhas coxas
transtorna o cotidiano
que vivia feito um pombo preso no túnel e depois alcançou a plataforma do metrô.

Mas os pombos não migram e prendem nas patas as linhas das pipas.
Do emaranhado solto o medo no meio e desfaço a tua relíquia.
Não é a primeira vez que lanço um pássaro sobre ti.

terça-feira, 27 de abril de 2010

quem conseguiu me perder

o que eu esperava era no parque de estacionamentos por um minuto avistar aquele por quem a vida corria. como uma estrela, uma pedra que me arrasava de energia, toda retirada, baratinava. sismo, relíquia. mas então veio todo o mundo do juízo , todo o meu poder de confissão. essa crença de que um falar profundo atingirá por toda superfície a pérola homem que cresce por dentro das ostras, das minhas coxas. transtornando o cotidiano como um pombo que ficou preso na plataforma do metrô, entre a estação de mim mesma e da mulher.

#

eu poderia fazer um livro de poemas de novo, ventríloquo. mas não é um livro de poemas. (depois disso até cifrei com um número no título: I) é um livro de um coração pra imensidão partido/ revolto. e que se pergunta onde para onde? o que pode vir e afirmar, sem que fique para trás?

#

quanto às citações, referências, reverências: de novo, têm me fatigado. a sucessão recorrente de dados, citações, como se abreviassem a vida. / e eu não conseguisse ler a cifra. ou fossem enganações partimentadas em frente a toda realidade. realidade = caótica, constante, absoluta. é. tudo é precário. às vezes na rua penso como esse velho conseguiu por tanto tempo?

domingo, 25 de abril de 2010

dis tan

há algo um pouco triste entre nós/ um pouco rígido/ algo um pouco/ só/ o que há entre nós

sexta-feira, 23 de abril de 2010

acho que o que mais dói na desilusão não é o inesperado; mas que já estava tudo ali, desde antes: claro. claro e menor, mais misturado, mas ali. é sempre isso o que mais me impressiona quando releio meus diários, como eu já sabia do que viria. hoje isso me entristeceu pacas. mas não sei se isso aumenta a minha parvoice ou sabedoria. se tenho vontade de perceber cada vez menos o que já sei, e nunca me impedir de lançar ao risco, ao erro, ou se confio, finamente, que tenho um radar e me protejo, daqui pra sempre, por onde voar. espero que não seja isso o que significa amadurecer.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

corazón que yo comando y no

"Não chegar ao ponto em que não se diz mais EU, mas ao ponto em que já não tem qualquer importância dizer ou não dizer EU. Não somos mais nós mesmos. Cada um reconhecerá os seus. Fomos ajudados, aspirados, multiplicados. (...) Desde que se atribui um livro a um sujeito, negligencia-se este trabalho das matérias e a exterioridade de suas correlações. Fabrica-se um bom Deus para movimentos geológicos. (...) Não há diferença entre aquilo de que um livro fala e a maneira como é feito. Não se perguntará nunca o que um livro quer dizer, significado ou significante, não se buscará nada compreender num livro, perguntar-se-á com o que ele funciona, em conexão com o que ele faz ou não passar intensidades, em que multiplicidades ele se introduz (...) Um livro existe apenas pelo fora e no fora. (...) Escrever nada tem a ver com significar, mas com agrimensar, cartografar, mesmo que sejam regiões ainda por vir. (...) A lei do livro é a da reflexão, o Uno que se torna dois. Como é que a lei do livro estaria na natureza, posto que ela preside a própria divisão entre mundo e livro, natureza e arte?"

Dos inícios do "Mil platôs", Deleuze e Guattari.

terça-feira, 20 de abril de 2010

em Portugal me dá uma tristeza como nenhuma outra, às vezes. tipicamente física. me sento em mim mesma e é visitar uma tormenta. mas não digo isso pra ninguém, nem tanto. nem por ser uma barata tonta e azulada.

domingo, 18 de abril de 2010

o amor é um sono que chega para o pouco ser que se é
cesariny

a mais ninguém
a indelicada gratidão
de um fim de tarde
encostava como em você

como se o horizonte inatravessável
fosse azul fosse outro
um cruzeiro que brilhasse embalando o oceano
pelo teu olhar olhava o céu claro
fosse o teu adeus
que caminhava até a foz.


(escrever de novo o que é isso que se diz aqui)

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tomei chuva ao pé de Alfama procurando por onde morar. só percebi que chovia quando a água já tinha escorrido do guarda-chuva amarelo nas minhas costas, por dentro do casaco. a saia ficou pesada de água e os pés empapados.

depois vimos uma pomba doente embaixo do arco-íris que montou sobre o Tejo e lembrei de ter visto uma pomba andando na plataforma do metro no Marquês. há pombas e pombas.

#

e como não sei onde vou morrer
ou mesmo morar daqui 25 anos
(5 não digo, que é pra não ter ansiedade)
me deito no lençol todo branco
não me esforço
só vejo nas minhas unhas um pouco sujas
a limpeza áspera das tuas mãos.






#

e é tudo tão calmo agora. você não imagina quando alguém entra na sua vida. e que tudo entrado vai ser colocado. e que tudo colocado vai ser transformado. e depois isso tudo fica. e depois a gente fica em tudo. é pra isso que a gente vive. é isso que a gente quer. se não, é menos do que querer. e menos do que querer, é muito menos do que viver. e menos do que viver, nem morte é.

sábado, 17 de abril de 2010

aqueles que nunca atravessaram o horizonte de si mesmos

não sei se é sorte
ou cruzeiro

um dos melhores modos de parecer fazer parte de algo, ou: um dos melhores meios de inspirar confiança: para si é sempre para o outro: parecer integrado, reiterado, pertencente, não desviar os olhos: sequer não pousá-los.

revolucionário mesmo é de repente frustrar o outro ao não defender o que gosta como o que é bom

ou alguém muoito esnobe a quem pergunto

por que a cultura é tão trajada?
por que há balões cor de dourados pendurados no teto?

com que cor de roupa estás?

você não, ali no fundo.

escondeu. se toda roupa é um código de esconder aqueles que se vestem com mais atenção estão escondendo na brincadeira?

ou tudo que escondemos é definitivamente uma simulação que está na roupa?

eu, a mulher-cavalo, azul marinho e vermelho-de-terra. cowboy e fertilidade.

jouer, joyeux, julee.

pensam de espinho para espinho

pessoas vem e vão. não sei, mas com algumas me esforço mais. outras, é explicitamente tão natural a aproximação, a ruptura. eu tive a maior necessidade de dizer que no espaço, as coisas só acontecem no tempo. ontem um arrepio de andar pelo bairro alto, como duas semanas atrás na vila madalena. não re-encontrei ninguém que não fosse o arrepio. e uma das melhores coisas que me aconteceu na vida foi ler anna akhmatova. e então, pela segunda vez, esqueci o livro no brasil.

sol

havia um tempo em que decalcar o silêncio, anulando-o, era a entrada para o estar em mim. de algum modo ainda é assim, só realizo o que me acontece quando escrevo. mas a correspondência, ou a europa, me trouxeram alguma espécie de reserva. essa reserva, temo, como uma gordura do pensamento, delícia e resto, é o que não vacila em se acumular. no entanto, um corpo forte. isso, ou a confusão espontânea entre o que vivo e traço. ou alguma incerteza do meio-fio, experiência da palavra como trânsito, fronteira, irrigação. ou complemento da necessidade do sentido. nunca sei mesmo se o que escrevo tem transparência suficiente para o entendimento. ou se é só uma sonoridade transitada que fica. sei que preciso matar em mim para escrever. para dar o conhecimento que tenho da palavra. é preciso matar para escrever. superego, inveja alheia, constrangimento do outro, o nome disso que mato, não sei. e o arquétipo do ceifador, a morte, o fogo não é brando. é um fogo de ontem, que não conseguiram controlar ao anoitecer. no entanto, minha vida segue sem você, sem escrita, sem estudo, sem trabalho. fui ao brasil, quando voltei, estava tudo aqui. e algo nas drogas já não me interessa tanto. e algo na idéia de brasil me interessa mais. e algo em portugal é o que vivo. seja aqui ou lá, há muita gente boa que me acompanha. desses quero a carne comida. não a aliteração da ausência. saber que os tenho comigo. e que em portugal não se sabe usar a minha língua. nem no brasil. uma língua de fronteira, nós produzimos encontros. sua solidão não me interessa. se estamos a todo momento brincando de cegos. guio a palavra que me guia. terra-terra-terra. this land is your sea. meu fenômeno é a lealdade. minha bandeira , pirataria do amarelo.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Cântico dos cânticos de salomão

eu era um mar de melancolia um coração pedra-bruta
um mundo sem alegria
ó doce loucura que me acontece ó língua de fogo que me entontece
meu amor nos meus braços adormece
mil maravilhas do mundo ele encarna


PIRÂMIDES DO EGITO
QUINTA AVENIDA MURALHA DA CHINA
MACHUPICCHU TITICACA
TRAFALGAR SQUARE COLISEU
CATARATAS DO IGUAÇU
MANHATTAN GUANABARA

seu corpo é gazeta ilustrada que folheio da primeira à última página
e vice-versa
em letras garrafais o cabeçalho da manchete JÁ é um alarde

"JÁ RAIOU A LIBERDADE"

meu amor decretou a abertura de todos os poros da minha pele
ele é meu
vento de viração barravento turbilhão doida canção de orfeu
representa Tróia que um dia o tédio de Helena varreu
um mar azul um barco bêbado a ânfora o vinho Ulisses ébrio Penélope
corisco que lampeja e lambe o lajedo da minha casinha sertaneja
ele é chave geral de usina elétrica tomada acesa incendiada
ele é minha cimitarra sarracena adaga afiada espada bárbara
ele é meu SOL minha luz minha brasa meu braseiro meu brasil tição
conquistador do pólo navio quebra-gelo que me derrete o coração
sou a sede de um rio corrente caçando o SAL do oceano ardente

SENEGAL
MADAGASCAR
HONG KONG
MÁLAGA
RIO DE JANEIRO
VALPARAÍSO


WALY SALUT AU MONDE


[do waly.]

sexta-feira, 9 de abril de 2010

sinto-me num momento muito fértil, mas estou só na terra. não há nada plantado que se fixe. mas este solo tem todos os minerais possíveis e necessários, tonalidade e umidade suficientes. e aqui estou eu, o chão.

terça-feira, 6 de abril de 2010

acho que chamavam sorte

ou fado-do-destino? deve haver no campo n'algum lugar uma flor a quem alguém chama assim.

por enquanto percebi que simplesmente minha vida mudou e que agora sou um transatlântico

mas um transatlântico bordado na fronha de um miúdo que dorme e baba no travesseiro

a saliva dele é o meu oceano

sábado, 3 de abril de 2010

 

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